Ganhei de um grande amigo um
livro curioso, que não vem ao caso nomear.
Ao virar a última página, acudiu-me a pergunta: o que faz um bom livro?
Devo
adiantar que o generoso amigo, dias depois, se desculpou pelo presente,
alegando tratar-se, em sua opinião, de um “livro chatíssimo”, que ele abandonou
lá pelo quarto capítulo. E recordou um princípio bem estabelecido: “A vida é
muito curta para se ler livro ruim”.
O severo
julgamento só me fez espicaçar a curiosidade. Afinal, o autor é
conceituadíssimo, quase unanimidade nas letras nacionais, domina à perfeição a língua, com elegância no
estilo e perspicácia no traçado de ideias originais; o tema é do mais alto
interesse e a pesquisa histórica, impecável; a edição, se não é luxuosa, é
sóbria e agradável.
Sobram-lhe
pois ingredientes para marcar época e
tornar-se um clássico!
Mas meu
amigo tem sua razão. Resulta um livro pesado, monótono, prolixo, repetitivo, em
muitas páginas cansativo e até sonífero. O que faltou? O que é necessário para
que se produza um bom livro? Vê-se que não bastam um bom tema, o domínio da
língua e um autor conceituado.
O autor se
prolonga em repetições e prolixidade inexplicável. Num mesmo (e sempre muito
longo) capítulo, misturam-se assuntos desconexos, que exigem verdadeira
ginástica mental, na busca de uma sequência coerente. Alguns fatos, que parecem
secundários, ocupam páginas intermináveis, em minúcias que terminam em becos
sem saída. Certas personagens ocupam destaque excessivo, a empanar a importância
de outras, que mereciam mais destaque. Algumas análises literárias e
artísticas, inseridas no contexto histórico, são tão subjetivas e imponderáveis
que parecem cair das nuvens. Sucumbe-se no desafio de misturar reconstrução de
uma época com crítica de arte.
Faltou
costura. Um bom livro precisa de ritmo, coerência, foco. Deve conduzir a
leitura por um percurso de conforto mínimo, com partes que se coadunem com um
todo apreensível. Não deve ser um quebra-cabeças.
Numa palavra, faltou ao autor
pensar no leitor; parece que escreveu para si. É uma obrigação básica de que
escreve: tornar a tarefa do leitor agradável, estimulante, fluida, convidativa.
Não quer dizer banalidade, quer dizer harmonia. O leitor deve ler como quem
passeia, como quem caminha por um jardim, como quem ouve uma sonata de Mozart.
Assuntos difíceis e subjetivos devem ser suavizados, na medida do possível,
desde que não se perca consistência. Afinal, talvez tenha faltado um editor-revisor
com autoridade suficiente para exigir do consagrado autor o uso do famoso lápis
vermelho. Cortar, cortar, cortar.
Escrever menos para dizer mais.
De minha parte, não me arrependo
de ter persistido e “vencido” as quatrocentas páginas do volume. Consegui
peneirar o valor que, apesar de tudo, se
escondia no fundo do livro. E tornar a pensar nesta pergunta que nunca se cala:
o que faz um bom livro?
KIO FARAS BONAN LIBRON?
Mi gajnis de granda amiko kuriozan libron,
kies titolon ne necesas eldiri. Kiam mi turnis la lastan paĝon, venis al
mi en la kapon demando: kio faras bonan libron?
Mi devas antaŭe diri, ke
la malavara amiko, post kelkaj tagoj, pardonpetis pro la donaco, aldonante, ke
temas, liaopinie, pri “tre enuiga libro”, kiun li forlasis post la kvara ĉapitro. Kaj
li rememorigis principon firme starigitan: “La vivo estas tro mallonga por ke
oni legu malbonajn librojn”.
La severa juĝo eĉ pli
incitis mian scivolemon. Nu, la aŭtoro estas tre respektata, preskaŭ unuanime laŭdata en
nialanda beletro, li perfekte regas la lingvon, kun eleganta stilo kaj sagaceco
en la elmontrado de originalaj ideoj; la temo estas plej interesa kaj la
esplorado de historiaj dokumentoj, senriproĉa; la eldono, se ne luksa, estas sobra kaj
agrabla.
Abundas do ingrediencoj por ke ĝi fariĝu epokfara
klasikaĵo!
Sed mia amiko siaflanke pravas.
Rezultis libro peza, monotona, mallakona, ripetema, en multaj paĝoj laciga
kaj eĉ dormiga. Kio mankas? Kio estas necesa por ke produktiĝu bona
libro? Oni vidas, ke ne sufiĉas bona temo, regado de la lingvo kaj prestiĝa aŭtoro.
La aŭtoro longigas ripetojn kaj neklarigeblan
malkoncizecon. En unu sama (kaj ĉiam tre longa) ĉapitro miksiĝas
senkonektaj temoj, kiuj postulas veran mensan gimnastikon, serĉe de kohera
sinsekvo. Iuj faktoj, kiuj ŝajnas flankaj, okupas senfinajn paĝojn, pro
detaloj, kiuj finiĝas en sakstratoj. Iuj roluloj okupas troan spacon, kaj vualas la gravecon
de aliaj, kiuj meritas pli da elstareco. Iuj analizoj literaturaj kaj artaj,
enmetitaj en historian kuntekston, estas tiel subjektivaj kaj senkonsistaj, ke
ili ŝajnas falintaj el nuboj. Fiaskas la defio miksi rekonstruadon de certa
epoko kun artokritiko.
Mankis
kunkudrado. Bona libro bezonas ritmon, koherecon, fokuson. Ĝi devas
konduki la legadon laŭ vojo de minimuma komforto, kun partoj, kiuj
kongruas kun ia perceptebla tutaĵo. Ĝi ne estu ia puzlo.
Unuvorte, mankis, ke la aŭtoro pensu pri la legonto; ŝajnas, ke li
verkis por si mem. Jen baza devo de tiu, kiu verkas: fari la taskon de la
leganto agrabla, stimula, flua, invita. Tio ne signifas banalecon, sed
harmonion. Leganto devas legi kvazaŭ li promenus, kvazaŭ li iradus
en ĝardeno, kvazaŭ li aŭskultus sonaton de Mozart. Malfacilajn, subjektivajn temojn oni mildigu,
laŭeble,
kondiĉe ke oni ne forperdu konsistecon. Fine, eble mankis eldonisto-revizianto,
kun sufiĉe da aŭtoritateco por postuli de la fama aŭtoro la uzon de la konata ruĝa krajono.
Forstreki, forstreki, forstredi. Skribi malpli por diri pli.
Miaflanke, mi ne pentas, ke mi obstinis kaj “venkis” la
kvarcent paĝojn de la volumo. Mi sukcesis kribri la valoron, kiu spite ĉion kaŝiĝas en la
fundo de la libro. Kaj denove pensi pri ĉi tiu demando, kiu neniam ĉesas: kio
faras bonan libron?
Amigo Paulo Sérgio, somente um poeta sensível e erudito escritor, amante das belas letras, poderia ter criado tão encantadora reflexão literária que, creio eu, salvo melhor juízo, tenha sido inspirada pelo filme "O Mestre dos Gênios" [sobre Max Perkins (Colin Firth) e Thomas Wolfe (Jude Law) ]. Parece-me que o referido filme contribuiu para comprovar suas sábias convicções.
ResponderExcluirEu não ousaria tecer qualquer comentário depois das sábias palavras de Nazaré Laroca, sinto-me esmagado entre o belíssimo texto do amigo Paulo Sérgio e a crítica da Nazaré. Gostaria de dizer, morrendo de vergonha, que quando acabei de ler o texto tive a sensação de que seria aplicável à música ou à pintura. Confesso que busquei ávido o arquivo sonoro desse texto na voz do Paulo Sérgio, infelizmente não encontrei, resta-me apenas colocá-lo numa moldura...
ResponderExcluirSua obstinação é um exemplo para todos nós, Paulo...
ResponderExcluirConfesso que jamais teria essa paciência franciscana, meu querido amigo.
Deus o abençoe.
Nem todo escritor consegue transformar em letras o que lhe corre pelas entranhas. Isso, meu caro Paulo, você realiza com maestria. Seu texto é o contra-exemplo da impressão que o livro lido lhe deixou. Uma suavidade literária com profundidade de conteúdo. Um deleite, enfim.
ResponderExcluirA isso dá-se o nome de crítica literária. Hoje, o que temos mais das vezes, são resenhas. Porém, para crítica literária autêntica, faltou o nome do romance que, por elegância, Paulo omitiu. Belíssimo texto, Paulo! Haverá réplica no Louco por cachorros!
ResponderExcluirResume: skribi komplekse kaj tede estas multe pli facile ol simple kaj interese!
ResponderExcluirKio faras bonan libron, jen proza demando. Sed pri kio faras bonan literaturan kritikon eblas lerni per tiu bela poesia esprimo de Paulo Viana! Arta estas la aliro al la temo, arta estas la stilo, arta estas la zorga kaj eleganta kondukado de legantoj per frata mano, per frata vorto. Unuvorte, arto!
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